ANTES QUE A NOITE CHEGUE

(SOLILÓQUIOS E METAMORFOSES)

É noite funda e o sono foi-se, foram-se os copos emborcados para o fundo do despejo de um estomago vazado, não me lembro se hoje comi, só me lembro do rosto dela e da cabeça dela de cabelo muito rapado, os pés muitos sujos. Tanta fragilidade. Até onde os meus olhos conseguem ir já varri a calçada mas o amarelo dos candeeiros apagam mais a vista do que alumiam e não há ninguém a quem eu possa perguntar se a viu passar, há-de ir a arrastar o outro chinelo e pelo som mesmo que a não consiga ver hei-de reconhecê-la e saber que é ela, grito o nome, qual nome agora me lembro que não sei o nome dela e a estas horas não me posso por a dizer puta de um só chinelo à janela ou a berrar a miúda que tem sede ou aquela que eu provei e que tem um sabor único a azul. Está mais azul que o negro da noite, vem-me de dentro e mais fundo que o estomago, aposto é da barriga da noite.

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