ANTES QUE A NOITE CHEGUE

(SOLILÓQUIOS E METAMORFOSES)
Aproximo o sebastião à boca e a sensação que tenho é que estou a beber de um esgoto, não aguento e vou vomitar outra vez, o taberneiro fulmina-me e berra até ao fundo esticando-me a chávena de café. Não consigo respirar. Se o fizer o balcão apara-me a miséria humana, ele ordena-me respira, respira e parece uma mulher prenhe em trabalho de parto, os braços redondos e as mãos sapudas e vermelhas a agitarem-se no ar, se não me sentisse tão mal ría, a culpa desta merda toda é daquela gaja de cabelo vermelho, por alguma razão se diz que não se deve confiar nas ruivas, porquê não sei mas sei que já ouvi ou já li isto em qualquer lugar, onde não me lembro, ainda por cima uma falsa ruiva o que é muito mais perigoso que uma loura a fingir, mas porque raio estou eu a pensar nestas porcarias todas agora se estou tão mal disposto? Olha... Afinal, já não me sinto tão mal, aliás até já estou bastante melhor, que coisa! Que é que eu bebi? Fernet branca. Branca? Aquilo era esverdinhado, acastanhado, lodoso, tens de me arranjar uma garrafa daquilo, é remédio, não é para andar a beber a torto e a direito e agora desampara o balcão que estás a espantar a freguesia e leva os óculos. Para ver a noite não preciso deles. Tenho-a por dentro.

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