ANTES QUE A NOITE CHEGUE

(SOLILÓQUIOS E METAMORFOSES)
Talvez se esta morrinha não caísse tão devagarinho a lustrar a calçada eu não me lembrasse dela, fechava a janela por causa do calor e debruçava a cabeça sobre o estirador nos papéis que estão em branco à espera de um traço um esboço um projecto que apareça à frente da vista ou um clarão que apague a mancha de azul que inunda todas as outras imagens que mal tentam aparecer aguam-se em manchas lentas até se dissolverem em castanhos sépias encardidos. Mas não para. Nem chove mais nem para. Uma merda. Fica neste constante respingar suspenso como se a qualquer momento me deixasse adivinhar mesmo no momento em que me preparo para fechar as janelas que há-de aparecer a arrastar o chinelo mesmo nesse momento a qualquer momento. E não passo disto. O momento. O branco. A diluição. O encardido. Agora vou mesmo fechar a janela não quero saber mais de momento nenhum quero chova muito ou pare de vez. Só me faltava baterem-me agora à porta, a vizinha a uma hora destas não há paciência, faço-me de morto ou morro de vez.

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