O que a boa comida caseira tem é que nos consola de barriga mas também de alma porque nos recorda a mesa de família. A mim traz-me azia, lembra-me o meu pai e o amor estúpido que a minha mãe e as minhas irmãs lhe tinham sem razão nenhuma, nunca gostei dele, um alivio quando a natureza cumpriu a sua função. Por isso o almoço de Natal em casa da vizinha foi um frete, uma seca, um bom peru é verdade, mas pouco fiquei a saber do que quería, também a pobre mulher não sabia nada, gosta de inventar para ir empurrando a vida e nem lhe levo a mal. Disse-me que a rapariga saiu porta fora e que chovía, desatou a correr rua abaixo, perdeu um chinelo e voltou atrás para agarrá-lo e depois sumiu-se na curva. Que não a voltou a ver por aqui e que até se dizia pela vizinhança que eu a tinha despedido por ela ser uma drogada mas já se sabe os artistas gostam dessa gente esquisita e o vizinho, eu, não fugía à regra. Pois não, tanto que tentei escapar e conseguiram prender-me à mesa de um almoço de Natal ao fim de tantos séculos e pelas razões que foram, se tu soubesses vizinha, se tu soubesses!
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