É cedo e é Domingo e eu já estou levantado porque tenho o trabalho que já devía ter sido entregue para acabar a ganhar pó em cima do estirador e a servir de base aos copos que vou substituíndo por outros cheios à medida que lhes vejo o fundo circular. Gosto de ouvir os passos na calçada que descem à medida do seu desaparecimento e lembro-me que na minha ausência recordava-os igualmente nas manhãs de silêncio enquanto a mulher ao meu lado dormía desconhecendo o ruído que eu trazía para o quarto para não me sentir tão só. Deve ser esse o meu problema. Nunca me sentir acompanhado com mulher alguma mas sentir mais a sua presença quando estou longe delas. Hoje sinto aquela mulher de pele negra e brilhante sentada no meu sofá a observar-me as costas enquanto trabalho dobrado no estirador. A linha das pernas dobradas a par e enviuzadas sobre a direita empinando os ombros e os seios grandes de mamilos escurissimos. Sei-a nua. Já me virei para a ver diversas vezes, já me levantei e apalpei o estofo à procura do quente de quem se levantou à pouco. Talvez tenha descido a calçada e a veja da minha janela. É dia azul e claro, tanta luz. Ouço saltos na escada de madeira, quem será a esta hora, batem na minha porta, batem no meu peito. Hoje sei quem é.
1 comentário:
Que bom!
E antes que anoiteça, um brinde a toas as noites que caem,,,
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